sábado, 1 de novembro de 2014

Auto-esclarecimento

Na tua cabeça eu sou aquele sobre quem a tua melhor amiga sempre te avisou para não te aproximares. Aquele a quem o teu último encenador culpava pela tua conduta insatisfeita.

Aquele que jamais te soubera resguardar porque sempre fora vil e egocêntrico no comportamento e nas palavras inconsequentes.
Aquele que sempre te viu como um ser menor e te ludibriou deliberadamente apenas por diversão, porque te afiguravas um acessório cómodo. Aquele que te prendia no seu mundo doentio do qual tu apenas não tinhas coragem para te libertar porque de ti precisava. Aquele que jamais se preocupara com o teu universo e que despudoradamente te sugara para o seu como se quisesse que tu te anulasses. Aquele que tentaria sempre alcançar a atenção de terceiros porque tu jamais lhe chegarias. Aquele que nenhum sentido faz na tua vida porque as diferenças são tantas mais que os pontos em comum. Aquele que nunca se preocupara em retribuir a tua atenção e colmatar as tuas necessidades quando não estavam em sintonia com as suas. Aquele que jamais cedera para se encaixar nas tuas diferenças porque as considerava desnecessárias. Aquele que não se preocupara em equacionar mudar de país sem que te priorizasse na equação.

E a tua cabeça é tão ardilosa na construção desta imagem que quase me convenceu dessa (ir)realidade. Mas eu sei que não sou esse, e o teu coração também o sabe melhor que ninguém.

Eu sou aquele que se arriscou a pedir-te para entrares na sua vida quando tu nunca te atreverias a dar esse passo, mesmo estando profundamente magoado pelo carrossel das emoções que anteriormente vivera. Aquele que te convidou a acomodares-te no seu mundo e te confiou a sua gestão partilhada para que dele pudesses usufruir em partes iguais. Aquele que nunca se esqueceu de te abraçar durante a noite e que sempre te incentivou a procurares o que te faz feliz, profissional e pessoalmente. Aquele que trouxe até ti essa mesma amiga quando por caprichos infantis se afastaram. Aquele que se lembrou de partilhar o teu aniversário com pessoas que já fizeram parte da tua intimidade porque respeita o teu passado. Aquele que, mesmo quando tinha razão, não deixou de abdicar do seu orgulho e de ultrapassar o teu para te trazer de volta. Aquele que, mesmo quando tiveste atitudes irreflectidas e consequentes de uma raiva infeliz, te soube perdoar e permanecer à espera que clarificasses as tuas emoções. Aquele que sempre tentou puxar pelas tuas capacidades, motivando-te e desafiando-te a exigires o melhor de ti. Aquele que se inspirou por tantas vezes com as memórias da tua existência na sua vida para criar obras eternas. Aquele que frequentemente desistira de vontades momentâneas por crer na tua importância como superior a qualquer desejo. Aquele que em última instância sempre para os teus braços regressou porque só neles faz sentido acordar. Aquele que tem por ti uma admiração igualável a que tem por si mesmo. Aquele que conhece todos os teus odores e os ama como se fossem seus. Aquele que te escreve com a mente no silêncio que tantas vezes lhe impões o dobro das palavras que te endereça. Aquele que tem a nobreza de admitir os seus erros, de tolerar os teus e de querer renovar a sua vida para ser parte do teu mundo. Aquele que não se importa sequer de ser magoado da mesma forma que te magoou para que te sintas em pé de igualdade e possas então virar a página. Aquele que está na disposição de que cresças e vivas outras realidades para que recordes que o que vivemos não é comum, não se encontra nas esquinas da vida e vale a pena ser preservado. Aquele que sempre te teve uma enorme amizade e conhece os teus gostos e expressões de olhos fechados. 

Se calhar já não importa esclarecer-te sobre quem sou, importava sim esclarecer-me após as dúvidas que te atreveste a fomentar-me.

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