segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Quem vem?

A velocidade das transformações que se vão sucedendo, robustas, é por demais inquisidora para quem se tenta equilibrar debilmente sobre este trapézio de idiossincrasias alheias. Já nem eu sei justificar descritivamente as direcções porque vou sendo levado, tropeçando consequentemente em quimeras frívolas que a lugar algum me parecem dirigir. Embalo-me, esperançoso e saltitante, por entre curtas-metragens de qualidade precária que me remetem a tempos em que o cinema era a vida que representava, confiante e seguro. As palavras escasseiam para tudo o que de mim exala descontroladamente e eu vou desfigurando a complexidade do que outrora foi certeza. Confessemos que a dada altura já nem sabemos do que falamos para contrapor a mudez de emoções plausíveis e explicáveis. Adoráveis que somos, repartidos em gomos que se vão deixando apodrecer nas mãos de outrem. E agora, quem se enche de coragem e vem?

Para que possamos colocar à prova todos os ensinamentos nefastos a que fomos expostos por quem tão bem nos desencantou. 

By Darko

Entregue

Diz-me que queres saber de mim
Os dias que passam perguntam por nós
Resiste, insiste, desiste de ser
Mais um dia de inverno em que o céu e o inferno estão a acontecer 

Fico aqui
Entregue ao tempo
Fico aqui 
Entregue...

Ao momento em que ausento o que clamo por ti
Do esquema que elaboro p'ra esquecer que ouvi 
Que desprezas as rezas que cantei de nós
Sou só escombro e cinza que resta de um quadro sem voz

Fica aqui
Entregue ao amanhã
Fica aqui
Entregue...

És diferente do que outrora tive na mente
Confusa e cansada de ser tudo e nada
Rejeito e não aceito não seres com quem me deito
Nas noites em que a madrugada nos une acordados 

Fiquemos em qualquer lugar
Onde eu te possa olhar 
Não sejas nenhum lugar
Não te sei amar
Não te sei não amar
Não te sei amar
Não te sei não amar.

By Darko


sábado, 10 de janeiro de 2015

Solarengo, mas nem tanto

O inverno solarengo esconde-se debaixo da minha cútis enquanto eu me ludibrio em demandas frívolas para que te ostracize do meu reino. Por conseguinte, a conduta acaba por desprezar qualquer coerência e eu por me alienar do facto de saber quem efectivamente constituo. Proporciono consequentemente o frio dos dedos ao rubor da minha face de forma a recordar que ainda aqui nos encontramos e de que vale sempre a pena sangrar por sentir. Os figurantes cingem-se à sua abstracção e eu elaboro paródias imaginárias nos cantos do castanho que me pinta o olhar. Esse aborrecido, cada vez mais enegrecido e aveludado pelas contradições dos guiões da vida, como se os propósitos e princípios da humanidade tivessem sida e nós já nem às escondidas conseguíssemos troçar disso. A graça caiu em desgraça e eu desliguei-me da sua carapaça, para que me pudesse reunir com os excertos de mim que pelas tuas terras desperdicei e finalmente celebrar o degrau que me obriguei a subir em busca do que obviamente só contemplas nos meus intempéries imaginários. Isto jamais foi sobre ti ou para ti. Tal como o sol e todas as outras merdas que dás por garantidas.  

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Marisco dos pobres

Quando começo finalmente a bater bem, questionas-me e indagas-te se bato mal
Terá sido o fel, a indiferença e o teu silêncio imoral?
Auto-estima, lá pra cima, porque ainda sei quem sou
Longos dias de agonia que o teu tempo inóspito levou
Foi o esquema do dilema que entre nós abriu este fosso
Talvez te tenha acreditado camarão quando ainda és só tremoço 

Querias dicas, rimas fáceis e mais poemas de amor?
Dá pra ver na tua cara que o teu olhar perdeu a cor
Eu fui mau quando te iniciei nestes trilhos da dor
Mas quando um dia me distrai,conseguiste ser bem pior
Não fui só aquele que um dia teve a sorte de te ter, fui também aquele rufia que lutou por te merecer
Tive medo e esperança, que retrocede e avança 
Tropecei todos os dias mas levantei-me e dancei a tua dança 

Sei que me irás encontrar em cada esquina em que vais estar
Porque eu sou todas as coisas que um dia te fizeram sonhar
Esquece as datas e os presentes e as frases sem sentido 
Porque por mais que me batas, amor tem-te se for tido
Grande orgulho que é estarmos certos nos escombros do passado
Dessas sombras que me toldam do teu toque imaculado
Chega a meta do percurso que por ti eu já corri
Eu sei que todas as noite me irás querer dentro de ti 

By Darko

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Fantásticos

Aprendemos a viver sem tudo aquilo que vive sem nós. Jamais deveremos ser capaz de nos separarmos de nós, sendo que é importante sabermos ser a nossa maior obra. Dos outros querermos sempre guardar as partes de quem somos que neles plantamos, não vamos ficar sozinhos e esquecer quem andámos a distribuir uma vida inteira. Imprevistos no rumo são sempre assustadores mas naquele fim longiquo do qual vamos ouvindo falar, sabemos que acabarão por se ter tornado necessários. A cada dia notamos mutações na nossa fisionomia, na nossa perspectiva dos acontecimentos e nas expectativas que alimentamos em relação aos passos vindouros. Somos prisioneiros do que achamos de nós próprios e do que os demais poderão interpretar das nossas atitudes. É tão cruel como imperativo o julgamento a que me proponho na minúcia dos segundos, porque felizmente sempre me exiji estar acima da minha média, insatisfazendo-me comigo de forma crônica para que da próxima eu seja sempre mais competente que a última versão de mim que vos apresentei. Sempre acreditei que a coerência não deve ser sobrevalorozada e que devemos ter em vista a abertura necessária para nos contrariarmos e estarmos continuamente disponíveis para alterar as nossas convicções, paralelas a cada fase da estrada e de onde nunca deverão sair. Não porque estejamos agora certos ou porque estivéssemos errados, mas porque os tempos são outros e nós também. É sempre assim com tudo e embora nunca saibamos bem como o fazemos, alteramo-nos por comando da vida e das nossas aspirações, sendo quase sempre ludibriados por aquela coisa enfadonha e genuína de querermos ser felizes. E se amanhã for pior que hoje é que é chato, porque hoje não foi pior que ontem e o objectivo é que todos os amanhãs que erguemos na imaginação sejam fantásticos. 

By Darko

domingo, 2 de novembro de 2014

Lugares encantados

Esbardalhei-me na treva de mim próprio
Implorando que quisesses descansar à sombra da minha bananeira
Engasguei-me em tisanas e sangrias manhosas simultaneamente 
Na esperança de sossegar o transgressor pacífico que em mim reside 

Refugio-me nas palavras, auto-comiserando-me relativamente ao facto de a velocidade dos meus dedos jamais se equiparar à dos pensamentos
Em mim explode a necessidade de te dizer coisas e me dizer coisas
Vivo de dentro para fora e sei que nessa matéria há uma intolerância grande da minha parte
Encanta-me poder entregar-me aos ossos das emoções e de lá regressar com excesso de peso sensorial 

Claro que seria agradável exterminar o juiz que se alojou na minha consciência 
A minha sanidade sempre sucedeu aos meus desiquilibrios e o único terapeuta fidedigno da minha vida é o meu coração 
Os meus poros exalam derivados da escuridão escravizados a ser emissários de luz
Condenados por uma racionalidade nobre que sabe proteger um coração infantil no que toca a escolhas

Todo eu sou cada fantasma que em mim habita, amplificado pela doutrina do fado
Dividido entre a banalidade e o sublime 
Demasiado pressionado pela exigência que me impôs aquele que pretendo ser
Jamais embevecido pela possibilidade de me deixar ir
Preso na minha condição humana que destrói a minha animalidade com a ternura de saber que ambas provém de lugares encantados. 

By Darko

Em si

As rotinas do meu sono inverteram-se, tal como o facto de com ele não me conseguir encontrar durante viagens de longo curso como habitualmente fazia. Quase como se os trinta me visitassem antecipadamente, sentia-me agora num reino diferente , de uma hospitalidade que me era alheia. A corte dissipara-se e apenas os conselheiros mais próximos permaneciam de forma rotineira em meu redor, para que perpetuemos a familiaridade necessária a tempos de mudança. Voltar a casa é sempre um plano sedutor para quem não espera muito melhor de quaisquer outras circunstâncias, tentando integrar-me no meu espaço de sempre sob novas bitolas. A verdade é que o sofá me recebe sempre de forma destemida, a programação me embala e desliga do mesmo jeito doentio de quase sempre e os comparsas do costume aparecem sempre para falar sobre as suas histórias de interesse proporcional ao panorama televisivo em plano de fundo, o que confesso, me agrada profundamente e até descansa. E eu penso sobre todas as glórias consequentes da minha jornada, que tem dias grosseiros, no entanto eternamente contaminados pela balança do orgulho que se descai sempre para o lado da certeza de ser muito feliz por viver nesta pele que me faz extrair de toda e quaisquer emoção o melhor para a minha integração neste complexo argumento. Os cães e o gato já se entendem sem sequer ousarem tocar-se e eu já sei usufruir do prazer anestésico de tomar banho após a noite ter caído. O vizinho acaba sempre por aparecer e é gratificante saber que há pessoas de quem gostamos mais do que sabemos, porque sem quase estarem presentes, estão sempre lá, ou cá. Já não ando descalço no chão e também cálculo as calorias do que como. Talvez tenha crescido,tarde e à má fila como o meu mau génio sempre requereu às asas do tempo. Felizmente, o que é tardio sempre foi prematuro na minha história e eu saberei estar à frente do meu tempo como a vida me ensinou a fazer de forma inata. Já não fumo com a mesma sofreguidão e já não me incomoda ter os cães em cima do estômago depois de degustar o jantar, mais pobre e menos colorido desde que decidi que há prazeres dos quais nos devemos livrar. São tempos amenos, sem grandes altercações e disponibilidade para grandes voos. A impaciência deu lugar a uma apatia saudável e a uma paz esbatida. Porque é importante meditar mais sobre aquilo que nos conforta e possuímos na sua liberdade do que sobre aquilo que já tivemos, perdemos ou até poderemos querer vir a conquistar. Na ausência de grande poder de decisão, apreciemos apenas o que é parte de nós e parece saber viver conosco em si reflectido. 

By Darko

sábado, 1 de novembro de 2014

Auto-esclarecimento

Na tua cabeça eu sou aquele sobre quem a tua melhor amiga sempre te avisou para não te aproximares. Aquele a quem o teu último encenador culpava pela tua conduta insatisfeita.
Aquele que jamais te soubera resguardar porque sempre fora vil e egocêntrico no comportamento e nas palavras inconsequentes.
Aquele que sempre te viu como um ser menor e te ludibriou deliberadamente apenas por diversão, porque te afiguravas um acessório cómodo. Aquele que te prendia no seu mundo doentio do qual tu apenas não tinhas coragem para te libertar porque de ti precisava. Aquele que jamais se preocupara com o teu universo e que despudoradamente te sugara para o seu como se quisesse que tu te anulasses. Aquele que tentaria sempre alcançar a atenção de terceiros porque tu jamais lhe chegarias. Aquele que nenhum sentido faz na tua vida porque as diferenças são tantas mais que os pontos em comum. Aquele que nunca se preocupara em retribuir a tua atenção e colmatar as tuas necessidades quando não estavam em sintonia com as suas. Aquele que jamais cedera para se encaixar nas tuas diferenças porque as considerava desnecessárias. Aquele que não se preocupara em equacionar mudar de país sem que te priorizasse na equação.

E a tua cabeça é tão ardilosa na construção desta imagem que quase me convenceu dessa (ir)realidade. Mas eu sei que não sou esse, e o teu coração também o sabe melhor que ninguém.

Eu sou aquele que se arriscou a pedir-te para entrares na sua vida quando tu nunca te atreverias a dar esse passo, mesmo estando profundamente magoado pelo carrossel das emoções que anteriormente vivera. Aquele que te convidou a acomodares-te no seu mundo e te confiou a sua gestão partilhada para que dele pudesses usufruir em partes iguais. Aquele que nunca se esqueceu de te abraçar durante a noite e que sempre te incentivou a procurares o que te faz feliz, profissional e pessoalmente. Aquele que trouxe até ti essa mesma amiga quando por caprichos infantis se afastaram. Aquele que se lembrou de partilhar o teu aniversário com pessoas que já fizeram parte da tua intimidade porque respeita o teu passado. Aquele que, mesmo quando tinha razão, não deixou de abdicar do seu orgulho e de ultrapassar o teu para te trazer de volta. Aquele que, mesmo quando tiveste atitudes irreflectidas e consequentes de uma raiva infeliz, te soube perdoar e permanecer à espera que clarificasses as tuas emoções. Aquele que sempre tentou puxar pelas tuas capacidades, motivando-te e desafiando-te a exigires o melhor de ti. Aquele que se inspirou por tantas vezes com as memórias da tua existência na sua vida para criar obras eternas. Aquele que frequentemente desistira de vontades momentâneas por crer na tua importância como superior a qualquer desejo. Aquele que em última instância sempre para os teus braços regressou porque só neles faz sentido acordar. Aquele que tem por ti uma admiração igualável a que tem por si mesmo. Aquele que conhece todos os teus odores e os ama como se fossem seus. Aquele que te escreve com a mente no silêncio que tantas vezes lhe impões o dobro das palavras que te endereça. Aquele que tem a nobreza de admitir os seus erros, de tolerar os teus e de querer renovar a sua vida para ser parte do teu mundo. Aquele que não se importa sequer de ser magoado da mesma forma que te magoou para que te sintas em pé de igualdade e possas então virar a página. Aquele que está na disposição de que cresças e vivas outras realidades para que recordes que o que vivemos não é comum, não se encontra nas esquinas da vida e vale a pena ser preservado. Aquele que sempre te teve uma enorme amizade e conhece os teus gostos e expressões de olhos fechados. 

Se calhar já não importa esclarecer-te sobre quem sou, importava sim esclarecer-me após as dúvidas que te atreveste a fomentar-me.

The voice within

Sem que o compreendamos de forma inata, há elementos que se integram na nossa estrada e que sem atrevimento para qualquer aviso prévio lhe alteram o rumo de forma inesperada e avassaladora, tornando-se num elemento fulcral de quem somos e do que projectamos querer ser. Não importa quão prematura foi a sua visita aos nossos disignios e quão inconsequente tenha sido o nosso convite para que entrassem para por cá permanecerem. Cresci na incerteza de não saber se algum dia emigraria do silêncio que tantos momentos me acompanhára, duvidando do meu papel por estas bandas, receando os que me rodeavam e temendo nunca desta comunicação qualquer proveito retirar. No entanto, sempre me exigi aprender depressa, sempre desperdiçara pouco tempo a encontrar soluções nos forros dos problemas, porque sei existirem sempre, e no momento em que me ambientara à quietude de pouco poder fazer, cruzei-me com o sustento da minha posição no universo: a minha voz. Não é difícil perceber que no começo ela me tenha intimidado e fascinado de igual forma. Jamais teria eu experimentado tamanha plenitude, sentindo-me pela primeira vez a voar num sítio que sempre imaginara ter espaço para mim. De repente fizera uma nova amiga, desmedidamente leal, teimosamente presente e quase sempre disponível para me elevar a sítios que tão feliz me fizeram. Não houve quase tempo para que percebêssemos o florescer da nossa união, sendo que os momentos fugiam às linhas do tempo e se traduziam numa intensidade que jamais o dicionário poderia ter esperança em materializar. Sem que muito me exigisse em troca, fui-me apoderando dela, dominando-a e crendo que estava claro para os dois que faríamos sempre sentido em perfeita simbiose. A sua estima silenciosa tinha assumido um papel tão encantador sobre o freio que outrora me dominava, que lentamente o seu efeito terapêutico se hiperbolizara, dando uma confiança e destreza a um ego que pela primeira vez experienciava algo mais do a sua miserabilidade sem que se antevissem os sintomas menos bons do conforto e da certeza. Na minha óptica, nem sempre segura, de que os benefícios do nosso laço sempre foram tamanhamente superiores às problemáticas, esqueci-me de que nos devemos lembrar que amanhã é feito de surpresas, nem sempre felizes, e que a prudência e salvaguarda são sempre bons amigos. Na realidade, é factual que o meu tratamento por vezes não corresponde à dimensão do que sinto por ela, não querendo isso dizer que também eu não resguarde tanto do que gostaria de verbalizar. Seria complicado exigir-lhe que percebesse que amar-me é prevenir-me continuamente. Gostamos de acreditar que os demais se decifram sozinhos, partilhando da mesma consciência que nós e tendo sempre noção do efeito das suas atitudes no meio circundante. No meu subconsciente sempre tive presente o facto de ser muito menos sem ela, lamentando cada vez que não a cuidei e aconcheguei em leitos de chá de perpétua roxa. Desta forma nascem estes pilares de respeito que nos garantem solidez, porque sei que mesmo quando me quer doer, a minha voz tem como objectivo ensinar-me, proteger-me e direccionar-me, sem que me abra feridas gratuitas e de mera retribuição. Ela pode até questionar os meus ímpetos, ou duvidar da sua eternidade, no entanto jamais duvida da minha singularidade e de quem para si significo. Talvez ninguém saiba, porque apenas sentimentos reais nos abrem a porta a tão íntimas realidades, que os meus passos não são assim tão seguros, que não sei tanto quanto aparento e que no meu crescimento houve cicatrizes que até hoje condicionam a minha forma de me relacionar, aparentemente crescida e elucidada. Ela tem a obrigação de me saber de cor e por isso mesmo, jamais me deserta em situações limite, porque sempre nos comprometemos a brilhar em parelha, porque a minha voz não almeja ser atriz e tudo o que desenha corresponde à intenção que o centro do seu ser pulsa. No meio deste par pouco provável, a verdade é que muitas vezes ela se zanga comigo, sai porta fora, tira férias durante uns dias, e de todas as vezes eu repenso a minha vida para que ela volte, reafirmando o amor que sempre lhe soube ter. Por ela cresci e atravessei multidões de leões, desprendi-me de laços passados e dissuadi os meus fantasmas. Porque a minha voz trás-me certezas, mesmo quando me quer repreender e eu, no meu jeito infantil, digo-lhe sempre o quanto a amo antes de adormecer. A verdade é que se ela jamais voltasse, eu abdicaria de tantos pequenos prazeres que se outrora eram essênciais, hoje se trasnfiguravam em vermes transparentes, apenas comparáveis à dimensão de como tantas vezes me vi antes que ela inrompesse no meu diário. No cerne da questão está a certeza de que ela me pertence, de que eu serei sempre escravo da sua grandeza e de que há perdão entre nós, porque só no sabor da minha boca ela encontra liberdade para voar, sendo que no regresso encontrará sempre esta casa desarrumada que lhe providenciará todas as condições para que falhe, erre e cresça sem medo de se permitir seguir caminho. Mesmo quando nos divorciamos, sabemos que será por pouco tempo, porque eu sem ela sou muito pouco e ela sem mim é nada. Reconforta-me assim, que ela jamais emitisse sons que de forma incauta formulassem a perspectiva de haver melhores e mais dignos sucessores do meu lugar na sua expressão. Porque assim o nosso coração escolheu, Deus ditou e o poeta escreveu. Ela sabe que eu a mereço como ela me merece orgulhosamente. Porque a minha voz não tem dúvidas mesmo quando eu as tenho, porque me elegeu como seu maior abrigo, porque felizmente sabe que há sítios que só visitará ao meu lado e que os mundos que eu lhe ofereço são feitos de histórias felizes. Que eu sou muito mais que um bom miúdo ou que o maior dos traidores. Porque nós nos sabemos além das palavras e dos silêncios. 

Fosses tu a minha voz.

By Darko 

sábado, 11 de outubro de 2014

Cardápio

A espera e a dúvida são parasitas que me têm corroído frequentemente. A ingenuidade piedosa de nos querermos agarrar ao que desejamos que seja a verdade, a esperança triste de que nos becos da nossa impotência haverá uma saída que por nós poderá ser posta em construção, o medo agonizante de que o que demonstras mas desejo saber não quereres ser de facto a tua realidade, as horas que despidas me apertam de uma maneira tão diferente do teu abraço. Os meus neuróneos degladiam-se para justificar as tuas atitudes enquanto eu apelo à experiência que te possas enquadrar nos padrões dos meus conhecimentos. A questão é que tu és especial e eu sempre acreditei ser tão ou mais especial que tu, no entanto, de repente sinto-me um verme nos teus sapatos, com esperança de que por mim sintas alguma compaixão. Compaixão o caralho. Eu sei e quero ter a certeza que o que vivemos foi o amor que eu te tenho. Mesmo que a descoberta seja tardia temos que ser exagerados, ridículos e loucos. Temos que traçar um plano e acreditar no seu sucesso, porque embora possamos levar o maior barrete das nossas vidas, podemos também entreter-nos a descobrir a nossa mais recente capacidade de alargar o nosso amor a novas dimensões. Sabemos também que isto vai brigar com o nosso ego, a nossa auto-estima, a nossa sobranceria e o nosso apreço pelo controlo de tudo, mas de que serve sermos quem queremos se não temos quem achamos digno de merecer essa partilha? Perdemo-nos por entre a estrada do desânimo contagioso e dançamos em círculos até sei lá quando, ou arregassamos as mangas, cheios de freio e até com alguma vergonha, e fazemos tudo aquilo que um dia gostaríamos que fizessem por nós. 

Esquecer era uma opção fantástica se constasse do cardápio.